Diário da Região SJ do Rio Preto por Cecília Dionizio – janeiro/2002
Homens perdidos e sem norte. Uma história que se repete a cada esquina. Eles estão desorientados, sem saber como se comportar diante das milhares de mudanças que a sociedade tem imposto com mais e mais rigor nos últimos 30 anos. Afinal, a graça já não está em anunciar que se é macho, mas sim que se é um homem pleno. Fortes, flexíveis e mais do que nunca sensíveis, a exemplo de muitas mulheres. Porém, nem todos sabem como conciliar estes novos papéis que lhe são cobrados.
O advogado Humberto Ferreira Júnior, 38 anos, recorda que há muito tempo vem tentando descobrir o que é ser homem, profissional e companheiro, sempre com muita dificuldade, pois quando imagina que está fazendo tudo certo, aparece alguém para alertá-lo de que não é nada daquilo. “Sinto-me desesperado, às vezes, pois não é fácil conviver com a cobrança constante de chefe, mulher, ex, filhos, pais e, ainda por cima, amigos”, explica. Para o psicanalista, o homem está cada dia mais desorientado diante das exigências atuais, pois tem de se mostrar macho sem ser machista; frio e calculista para dar conta da lógica das relações econômicas e, ao mesmo tempo, terno e acolhedor no lar; fazer sua jornada de 8 a 10 horas diárias no trabalho, mas ter disponibilidade e responsabilidade na condução da casa e da família. E a mulher nem sempre se satisfaz com menos.
O paulista Athayde Lucas de Araújo, 39 anos, se surpreende diante de tantas mudanças.
“Estou separado da minha mulher há pouco mais de cinco meses e até agora não encontrei um equilíbrio para viver sem ela por não saber o que querem de mim. Se tento voltar com ela, passo por bobo, se não faço nada, sou displicente. Já percebi que se não me cuidar, morro sozinho e louco. é muito mais fácil subir num ringue do que tentar competir no dia-a-dia com as exigências da vida”, comenta. O psicanalista Miguel Perosa constata que no fim, apesar de todas as absurdas elaborações a respeito do papel do homem na sociedade, a pergunta que cabe é essa: “Quem é que quer esse homem?”
Ele mesmo responde.
“Impera hoje, uma cultura vazia de valores humanos, que não lhe dá um norte por onde seguir. Uma cultura utilitarista, cujo valor maior é a aparência. Que pede ao homem que desempenhe papéis contraditórios entre si, mas não faz a síntese de princípios éticos e estéticos capaz de significar e dar finalidade a cada um desses papéis. Vivemos hoje, uma cultura, enfim, que desampara o homem e o deixa sem bandeiras porque a própria sociedade está perplexa diante das transformações que a técnica imprimiu nos relacionamentos humanos (profissionais e pessoais).”
Na opinião do psiquiatra Luiz Cuschnir, coordenador do Gender Group do Instituto de Psiquiatria da Universidade de São Paulo, criador do “masculinismo” um contraponto do feminismo, a mudança nos paradigmas causou um forte abalo no homem. Cuschnir é autor de vários trabalhos sobre o homem e está em seu quarto livro sobre o assunto, “O homem e Suas Máscaras – a Revolução Silenciosa” (editora Campus). Para ele, situações como morte do cônjuge, divórcio e demissão, há cerca de 30 anos, eram as que mais o abalavam; hoje não há muita diferença e sim uma inversão na ordem dos transtornos no que mais o desespera. Atualmente, o homem em geral ainda se sente frágil diante da separação e do desemprego, mas tem se pautado pela mulher, que é muito mais flexível. Isto porque já não pode mais se pautar pelo sexo ou apenas pelo papel de provedor. é preciso abrir os horizontes, pois não só a mulher, mas a sociedade, admira o homem que consegue assimilar a nova identidade.
“Ele precisa se alçar numa base que lhe dê capacidade de desenvolvimento total. Precisa saber sentir, perceber e ter sensibilidade para mudar, é essencial“, diz Luiz Cuschnir.