Se tem filho por perto, tem que ser fino

Revista Lola – 02/2012 – Luciana Ackermann

“Todos estão machucados e precisam de cuidados” Luiz Cuschnir (psiquiatra, psicoterapeuta e supervisor do serviço de Psicoterapia do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo) diz que é bom lembrar: os filhos são a parte mais frágil de uma separação.

LOLA: Quais os principais – e universais – dramas de uma separação?

LUIZ CUSCHNIR: Em geral, as pessoas se casam para se sentir protegidas e gozar de certos confortos que o modelo tradicional de casamento promete. Quando elas se separam, além das frustrações pessoais, começa a busca pela identidade individual que se perdeu na união. É muito comum a sensação de que não são mais como eram que se perderam de si mesmas. Os casais sentem esses dramas – e com os filhos não é diferente. Eles estão no meio das relações e algumas vezes acabam virando depositários das frustrações do casal. O chão que antes dava sustentação ruiu e acabou para todos. Alguns sentem alívio imediato. Outros ficam com saudades de como “ra antes”. Novas preocupações aparecem no lugar do que antes parecia perfeito. É um período bem dramático, porque tudo é incerto, ameaçador. Os casais sentem muita culpa. Há ainda a grande preocupação da vergonha pelo fracasso. Como esses casais deixaram de ser casais, como fazer para contar para a família e para os amigos? E sobretudo, como falar para os filhos que falharam? Fora a busca pelo culpado… Os ataques são comuns, iniciados por um ou pelos dois, por causa de anos de mágoas. Aí passam a viver uma guerra, às vezes, quase sem fim, que dura anos.

LOLA: E quais são as principais mágoas?

LUIZ CUSCHNIR: Parece que tudo é mágoa e frustração. Nesse momento, os casais experimentam algo para o qual jamais se preparam, porque, lá atrás, estavam imbuídos de um projeto de ficar e construir uma família. Há um sentimento de perda, fracasso, fraqueza, desilusão, abandono dos sonhos. Todos estão machucados e precisam de cuidados. Essas mágoas podem evoluir para raiva, ódio e, no limite, desejo de vingança. Elas estão vinculadas à sensação de que o outro roubou algo, roubou desejos e sonhos da felicidade que teriam “se”… É claro que as pessoas mudam com o tempo, mas essas mudanças não são computadas. Cada um mostra só uma parte de si, depois aparece o resto, que pode não ser tão legal. Com a chegada dos filhos, facetas que antes eram desconhecidas aparecem, incluindo aí o ideal de pai ou de mãe que gostariam de ser.

LOLA: Como enfrentar essa fase de forma menos penosa?

LUIZ CUSCHNIR: É preciso tentar viver esses sentimentos da maneira mais sensata possível. Quanto mais alarde, mais danos eles trarão a todos os envolvidos. Para que todo mundo se fortaleça e consiga se reestruturar individualmente, é preciso tempo, que pode ser trabalhado melhor em psicoterapias que os ajudem a entender o que há por trás do rompimento e qual são os próprios movimentos que provocam a deterioração do vínculo conjugal. Nesse momento, é bom também deixar expectativas de lado, seguir a vida buscando recompô-la, saindo do papel de algoz ou de justiceiro. É muito importante não esquecer o que foi vivido, para que o casal entenda o que aconteceu, com quem e como falhou. Um pouco de distanciamento e ter outras perspectivas de vida também é bom. Procurar novas atividades, retomar projetos pessoais abandonados em prol do casamento… Ter alguém para compartilhar o sofrimento é essencial, mas os filhos nunca são uma boa escolha. Eles são a parte mais frágil e já estão passando por uma mudança severa no percurso de vida.

LOLA: Além das mágoas da separação, há aquelas que podem aparecer quando o outro começa a recompor a vida, como começar a namorar outra pessoa, certo?

LUIZ CUSCHNIR: Não dá para não ter ciúmes, mas não se deve fazer disso uma guerra santa. A maioria das pessoas que se separam não pensa em ficar sozinha. Pensa em reconstruir a vida ao lado de uma pessoa que a valorize, que cuide, dê atenção, mas não se dá conta de quando isso se perdeu na relação, quer e pronto. Sempre haverá alguém que preencha os requisitos de parceiro ideal – e se deve tomar muito cuidado com a fantasia que projetamos no outro.

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