Revista do Esporte Clube Pinheiros – edição de agosto/2011
A ideia é falar de uma geração que, apesar da vida corrida, está envolvida tanto ou mais que as mães na criação dos filhos. Para o senhor ter um exemplo, um dos nossos entrevistados é o apresentador Marcos Mion, que já pegou avião só para dormir com o filho (trocar a fralda) e depois voltou para o Rio para gravar uma novela
Pergunta: Por que, mesmo tendo uma criação diferente, alguns pais quebram a barreira e se envolve bastante na relação com os filhos?
Luiz Cuschnir: Os homens ganham muito com essa relação. Podem oferecer e receber, trocam afeto, retomam momento anteriores de suas vidas como exemplo, têm a sensação clara de um sentido do que aprenderam podem passar, ensinar etc.
Pergunta: Podemos dizer que esta participação é marca de uma nova geração? Qual geração e por quê?
Luiz Cuschnir: Desde o advento do femininismo, houveram profundas mudanças nas relações familiares. Com a mulher ocupando outro espaços sociais, os homens, com o Masculismo (tese de mestrado na Fac. Med. Da USP – Masculismo, um estudo através do Gender Group® – que apresentei em 1998) tiveram a oportunidade de desenvolver vários papéis, inclusive o de pai. Nas últimas décadas tivemos muita essa transformação.
Pergunta: Quando perguntado para alguns pais tudo ainda parecia muito novo. O senhor sabe quando essa relação, pai e filho, começou a mudar?
Luiz Cuschnir: Quando a mulher saiu para o trabalho, dedicação à vida profissional e responsabilidades econômicas dentro de casa, os papéis foram mudando gradativamente, desde a década de 90. No começo ainda era esquisito ver pais em play grounds cuidando de filhos. Poucos iam à escola acompanhar a evolução escolar. Não frequentavam a terapia dos filhos. Mais perto de 2000 isso foi ficando mais comum.
Pergunta: Quais são os benefícios da presença do pai para o filho e para ele próprio?
Luiz Cuschnir: o filho pode ter a visão masculina da vida, não e´só educado pela mãe. O pai tende a mostrar um lado mais prático e mais amplo, dando um campo mais aberto de conqusitas para esse filho.
Pergunta: Como o pai faz para conhecer melhor seus deveres e direitos?
Luiz Cuschnir: Se questionando como foi com ele e o que ele senti mais falta na própria educação. Em geral esse é um bom recurso para refletir e descobrir como está sendo o seu filho e o que ele pode estar precisando. Reconhecer seus deveres tem a ver com responsabilidade que hoje passa a ser mais ampla na família e com um lugar mais claro com o filho. Quando ao direito, ele deve se colocar com tantos direitos como a mãe de orientar e acompanhar o filho, senão fica uma relação de segunda categoria e não prioritária como deve ser. Para tanto as responsabilidades são equivalentes às da mãe. Ele perde o direito equilibrado quando não assume as responsabilidades também.
Pergunta: Esse pai assumido é sensível e presente. Ao mesmo tempo ele consegue impor a autoridade?
Luiz Cuschnir: A autoridade pode ser colocada de várias maneiras, com posturas diversas. O pai pode simplesmente mandar e exigir, pode educar com exemplos, pode ser um modelo de atitude, pode demonstrar carinho e afeto ao se dedicar e orientar ou exigir. É necessário ter sempre em mente que quem é o adulto mais velho é o pai e a partir desse lugar que ele escolhe o seu estilo de ter o poder.
Pergunta: A nova paternidade reforça a masculinidade e dá mais segurança ao homem?
Luiz Cuschnir: Sempre foi importante para o homem ter filhos, pois dá a noção de continuidade e muitas vezes de sentido de vida. Sentir-se capaz, fértil, reprodutor, conecta-se com a masculinidade e toda noção de identidade masculina. A segurança pode advir daí, mas também sabemos que muitas vezes perante os filhos, a insegurança pode aparecer quando não está claro o que se está oferecendo ao filho. O pai deve saber e acreditar que está oferecendo o melhor de si. Se o filho aproveita é outra coisa.
Pergunta: O senhor criou em 2004, no Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas (SP), um grupo de discussão com pais e mães a respeito dos respectivos papéis. Quais foram os resultados sobre esta relação?
Luiz Cuschnir: Na verdade estou no Instituto de Psiquiatria trabalhando há mais de 35 anos. Criei o Gender Group® lá em 1995 para ter um campo de estudos da identidade masculina e seus conflitos. Em 1998 ampliei para as mulheres com o mesmo intuito e possibilitar o desenvolvimento do relacionamento entre ambos. Desde então esses trabalhos e estudos eram realizados e a partir desta data de 2004 têm uma ação psicoterapêutica focal com uma equipe especializada nas questões de gênero e os papéis do homem e da mulher na atualidade. São oferecidas psicoterapias com começo, meio e fim com o pagamento simbólico, com o objetivo de desenvolver os papéis que advém daí. Como é um trabalho com o homem e a mulher contemporâneos, os papéis de pai e mãe são abordados frequentemente. Os homens se sentem totalmente autorizados em lidar com os filhos e precisam sempre ser relembrados que não precisam ser maternais para cuidar deles – devem ser paternais, serem pais como homens e não imitando as mulheres. As mulheres muitas vezes precisam ser alertadas que podem estar impedindo essa relação com os pais quando ocupam o espaço que deveria ser do pai. Temos vagas abertas para os interessados em trabalhar estas e outras questões relacionadas.
Pergunta: Como essa mudança na postura reflete no filho e no pai?
Luiz Cuschnir: Temos homens mais integrados e com uma visão mais ampliada do que é a relação homem/mulher. Pais mostram e aprendem muito com isso e podem rever seus valores e atitudes tornando-se mais acessíveis a todos que os rodeiam. Os filhos têm acesso a modelos mais viáveis de trocas do que pode ser útil para suas vidas.
Pergunta: Em 2004, esse assunto era visto como “o novo conceito de paternidade”. Hoje como ele pode ser colocado e por quê?
Luiz Cuschnir: Como o meu trabalho acompanha as mudanças da sociedade contemporânea, os conceitos se renovam e cada vez mais vemos pais conversando com os outros de seus filhos. A paternidade é um assunto para os homens que muitas vezes precisam de outros homens para trocar idéias sobre seus filhos. Ambos estão mudando e isso renova esses pais a todo momento.
Pergunta: Estar presente e ligado é muito mais do que realizar as tarefas domésticas?
Luiz Cuschnir: Nem sempre é possível estar presente, pois ainda o homem é o principal provedor da casa, principalmente se a mãe ainda cuida de filhos pequenos e não pode se desenvolver na carreira profissional. Então acompanhar mesmo que com notícias e procurar trazer a realidade dos filhos para o relacionamento dos dois, já é bastante importante. Também pode ser bem interessante que os filhos vejam este pai também cuidando da casa, pois dá a eles a dimensão do que pode ser para um homem ter uma casa para cuidar.
Pergunta: Como não se tornar um pai superprotetor?
Luiz Cuschnir: As mulheres de fora podem dar sua visão disso. Mas também um pai que consegue lidar com seus conflitos e experiências negativas, percebem melhor o que é cuidar e o que é superproteger.
Pergunta: No Brasil, as políticas públicas favorecerem a figura paterna? Estamos longe da licença parental
Luiz Cuschnir: Temos uma breve licença paternidade, mas isso ainda não é suficiente, pois nem a sociedade privada tolera homens que se dedicam aos filhos em detrimento do trabalho. Mesmo em termos de educação formal, os jovens não estão aprendendo como formar uma família e discutir o papel paterno. Ainda há muita ênfase no papel da mãe como o centro da formação da identidade dos filhos. Já temos uma maior abertura de juízes que realmente têm um olhar equidistante para pai e mãe quando da guarda e sustento de filhos. Ainda há muito espaço para valorizar o homem como pai nessas políticas.
Pergunta: Como a mãe pode ajudar a torna um pai participativo?
Luiz Cuschnir: A regra geral é não atrapalhando. É muito comum a mulher ainda denegrir a imagem dele e desautorizar seu papel de educador, seja por ressentimento seja por ter uma visão diferente da dele para com o filho. Isso, acrescido de críticas diretas a ele pelo jeito que ele está se conduzindo perante os filhos, já são o suficiente para desmotivá-lo.
Pergunta: O senhor consegue lista alguns aspectos essenciais para o nosso leitor identificar se ele é um “pai moderno”?
Luiz Cuschnir:
- Sabe onde, como e quando ocorrem as matérias, as atividades escolares e extra-escolares deles?
- Já frequentaram os lugares aonde eles vão, conheceram professores e amigos?
- Frequentam o quarto deles?
- Sabem o que eles gostam de comer?
- Conhecem os médicos e demais profissionais que os atendem?
- Sabem cuidar da higiene deles?
- Saem com eles sem a mãe?
- Viajam?
- Conhecem o laser deles e já ao menos tentaram participar?