A terapia para o Novo Homem e a Nova Mulher

Correio Popular de Campinas, maio/2011

Pergunta: Você usa com frequência a palavra “mudança de paradigma” e Novo Homem e Nova Mulher. O que isso de fato significa?

Luiz Cuschnir: A mudança de paradigma ocorre desde o movimento de liberação feminina, que trouxe enormes avanços para as mulheres, mas alterou a forma como homens e mulheres se relacionaram, dentro de casa, nos ambientes de trabalho, no âmbito social etc. Os papéis se misturaram um pouco. Mulheres tiveram mais chances de uma carreira profissional mais bem sucedida, mais poder de decisão em sua vida pessoal e não se restringiram mais a ficar em casa esperando aparecer um marido ou o mesmo voltar para casa. Então a Nova Mulher tem o desafio de equilibrar todas as conquistas feministas com seu lado mais feminino sem perder a delicadeza ou o espaço conquistado. Mas, se por um lado ela está hoje em um momento de maior conforto, porque não precisa se esconder ou subestimar, por outro se sobrecarregou com o acúmulo e a cobrança dos papéis que encara hoje em dia.
Já o Novo Homem é aquele que notou essa mudança nelas e desenvolve não só um potencial para relacionamentos, mas também integra emocional com o racional, não descuida da aparência pessoal nem da própria saúde. É o homem que se dá a chance para a sensibilidade e beleza, sem abrir mão da masculinidade, mesmo porque essa sensibilidade que eles estão desenvolvendo não é a mesma das mulheres. Ele tem uma identidade própria. Eu chamei esse movimento do Novo Homem de Masculismo (termo cunhado na literatura em minha dissertação de mestrado na área de Psiquiatria da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo) que, diga-se de passagem, é um movimento correspondente ao Feminismo com uma tentativa de se chegar a um homem mais completo e preparado para as mudanças no mundo feminino.

Pergunta: Como a procura pelo autoconhecimento pode ajudar no rendimento profissional?

Luiz Cuschnir: Com a necessidade constante de aperfeiçoar a carreira e corresponder às necessidades do ambiente profissional, é difícil que não haja um desgaste pessoal e interferências na vida diária que podem causar grandes danos tanto na esfera familiar como no próprio desenvolvimento da carreira. Quanto mais a pessoa se assegura da sua identidade mais ela pode utilizar o seu potencial para vencer os obstáculos que vão desde as dificuldades de relacionamento como de ampliação de conhecimento. O bloqueio emocional e conflitos mal resolvidos em uma área podem interferir drasticamente no seu rendimento portanto cuidar de si acarreta diretamente em cuidar do que faz no seu trabalho.

Pergunta: Você acha que a psicanálise tem sido uma válvula de escape para quem não tem nenhum vínculo religioso?

Luiz Cuschnir: São de campos diferentes e quem utiliza uma ou outra como válvula de escape, não estará se beneficiando do melhor que cada uma pode oferecer. Cada um deve viver plenamente suas convicções religiosas no que tange aos aspectos espirituais e crenças. Um trabalho psicoterapêutico bem realizado implica no indivíduo desenvolver suas capacidades e relacionamentos de uma maneira consciente e segura para dirigir-se a uma maneira de vivenciar a vida integralmente. Uma é da área das ciências humanas e outra da vida religiosa que implica nas crenças que tem..

Pergunta: Há uma certa tendência entre os intelectuais em refutar qualquer obra que tente mostrar caminhos, receitas prontas para se dar bem na vida, no trabalho. O que você acha da invasão da auto-ajuda na sociedade?

Luiz Cuschnir: Por um lado há um apelo comercial e interesses econômicos envolvidos mas temos também que levar em conta que há pessoas que desejam respostas mais simples que venham de fora e não do seu desenvolvimento pessoal que correspondem ao que ela é como indivíduo, com sua particularidade. Enquanto houver mercado e consumo para essas receitas de como viver, haverá esse tipo de literatura que para muitos é suficiente ou ao menos estimula a reflexão.

Pergunta: Em seus workshops você diz que os assuntos correntes são contraindicados para homens que não querem entrar em contato com o que sentem. O que quer dizer com isso?

Luiz Cuschnir: Existem ainda homens que não querem falar de suas angústias ou do que sente porque foi educado a pensar que isso pode afetar sua masculinidade. É o medo de passar ridículo, de ser zombado, por isso ao ficar calado, ele assume uma postura de preservação. Parece que se ele se abrir, vai expor fraquezas. Homens no geral, até por causa da educação que tiveram (muito disso pode até vir da mãe) acabam sabendo muito pouco sobre suas próprias emoções, apesar de vivenciarem sentimentos muito fortes. A “provocação” que coloquei no texto do workshop é justamente para que esse homem saiba que ele, sim, pode se abrir, pode ter contato com o que sente e mais, pode trocar suas vivências emotivas com outros homens e ver que eles também têm dúvidas, também têm angústias e também não precisam ser um super-homem.

Pergunta: Como o seu trabalho tem sido recebido pelas empresas?

Luiz Cuschnir: Na década de 1980 desenvolvi o que chamei de Gender Group®, uma forma de terapia em grupo, onde se discutiam os papéis dos homens e das mulheres nessa sociedade contemporânea, pós-feminismo. Já nos anos 90, escrevi os primeiros livros e levei o Gender para o Serviço de Psicoterapia do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo com muito sucesso, realizando grupos só de homens e grupos só de mulheres e em determinado momento, os dois grupos se uniam para trocar o que descobriram e queriam conhecer do outro. Todo esse projeto me levou aos livros seguintes(publiquei oito ao todo, como autor) e recentemente levar o Gender para dentro das empresas, mesmo porque a relação homem-mulher no ambiente de trabalho mudou. O que fazemos nas empresas é tratar os relacionamentos entre os profissionais, visando a transformação das relações de trabalho, baseadas em respeito, responsabilidade e humildade para atingir profundamente o trabalho de reconhecimento em equipe. Isso funcionou muito bem em empresas como ELETRENGE, Caixa de Benefícios dos Advogados, Centro Cultural de São Paulo, Colégio Bandeirantes, Banco Itaú, AbnAmro Bank, Banco Real, CHESF, UNILEVER, O Boticário, entre outras.
Só quero lembrar que uma das características desse trabalho, e talvez o ponto que encantou essas instituições, é que não existe um pacote pronto que aplico indiscriminadamente nelas e sim, o que ocorre é muita conversa com vários níveis hierárquicos da empresa, para identificar o cerne das questões de relacionamento interno para assim chegar a uma conclusão de qual o melhor caminho a seguir.

Pergunta: De forma resumida, qual é a diferença primordial entre o seu trabalho voltado para os homens em relação ao feito para as mulheres?

Luiz Cuschnir: Procuro sempre aplicar as mesmas abordagens teóricas e exercícios práticos pois observo o tema do gênero como base de tudo. O grupo masculino tem características únicas como a ironia para falar de si, uma certa dificuldade inicial de se abrirem e uma cumplicidade que estabelece como muita consistência e que propicia o relaxamento para se deixarem conhecer uns aos outros. No grupo feminino o clima é sempre mais sério, implicando na responsabilidade desde o início, sem deixarem de lado o apoio mútuo constante. Os depoimentos são profundos desde o início mas somente com a evolução do trabalho as mulheres passam a autocrítica e deixam a vitimização para encontrarem a força que existe dentro delas.

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