Entrevista concedida à Léa Maria Aarão Reis
O homem de meia-idade é comumente chamado assim quando ultrapassa a fase de adulto jovem e na maturidade. Pelo menos assim eu vejo este tema e é a partir daí que eu vou colocar os meus conceitos.
Podemos dizer que ele não entrou no que se chama terceira idade. Está cada vez mais difícil delinear esta etapa, isto é saber-se quando deixou de ser jovem adulto e passou a ser um homem maduro.
O que consigo entende é que ao redor dos 40 anos aparece mais claramente o amadurecimento do homem. Este amadurecimento vai se completando nesta década de sua vida. É nesta fase que poderíamos chamar o homem de meia idade, ultrapassando os 50 com as variações individuais.
Neste momento inicial, há uma confluência entre a angústia e confusão que gera a crise da idade do lobo e ao mesmo tempo a estabilização e sedimentação que propiciam o equilíbrio da maturidade masculina. Eles não se sentem amadurecidos suficientemente para entrarem em uma estabilização enrigecida, nem jovens como antigamente eram antes de conquistarem sua posição e poder sobre o que está a sua volta.
Quanto mais 40, mais lobo. Quanto mais 50 e poucos, mais sedimentado.
A aproximação ou ultrapassagem dos 40 tranquiliza o homem em vários aspectos de sua empreitada na conquista do título de “Sou homem”. Este título ele persegue por todo o seu desenvolvimento na masculinidade e confirmação de vários conceitos que o definiriam como homem. Passa pelo desenvolvimento infantil de diferenciação da mãe-mulher, pela confirmação adolescente de que não é homossexual, pela capacidade de performar uma relação heterossexual, que consegue elevar-se ao posto dos que ganham dinheiro e se sustentam. Depois, muitos experienciam o aprendizado profissional e com isso, dependendo do grau, os louros da vitória de galgar postos melhores e mais seguros para sustentar ou propiciar estabilidade financeira para mulher e filhos. Já passaram então a hora que casam e podem já estar casados. Tem que conseguir mais, ultrapassar níveis de status econômico assim podendo percorrer os caminhos da confirmação do “ser homem”.
Nos subterrâneos deste percurso sobram as vivências infantis sexualizadas, diferenças com outros meninos, rapazes e homens, com quem vão se MEDINDO para saber se são MAIS, MENOS ou IGUAIS aos outros.
A parte disto está as vivências de rejeição feminina que são colecionadas desde a identificação de si mesmos como pai, muitas vezes mal-dito pela mãe e avó e outras rejeições de irmãs, primas até chegar nas garotas que lhe interessam e que muito frequentemente não lhes dão a menor pelota. Quando ultrapassam isso e vão para a vida afetiva estão cheios de cicatrizes que marcam seus movimentos e envolvimentos. É com isso tudo que chegam à idade madura e estão prestes a passar pela do lobo ou ir direto para meia idade.
Tendo claro porque coloquei que é um título que ele persegue, é que conceituo o porque acredito que nesta fase acontece a sua confirmação como homem. Alguns a recebem apaziguados, outros anseiam por comemorações as vezes mais ruidosas. Entram em uma escala com variações entre o homem-garanhão, protótipo da idade do lobo e o homem-resignado, protótipo do que se prepara para a terceira idade.
Dizer que ele está falido, é não perceber a quantidade de homens que procuram se atualizar dentro dos mais variados recursos. Os profissionais não conseguem mais se eximir das diferenças que ocorrem nos ambientes de trabalho com a presença da mulher muitas vezes ocupando cargos que antes eram prerrogativas deles. Os homens em casa não conseguem conter as mulheres como conseguiam até a poucos anos atrás. As solicitações mudaram muito e o homem de meia idade, diferentemente do da terceira idade que se acomodou, sofre com tudo isto. E sofrer, na maioria das vezes impulsiona o homem para buscar novos caminhos. Vejo com muita frequencia a angústia deste homem perdendo o poder aquisitivo, ao mesmo tempo com crises sérias conjugais (após 15, 20 anos de casamento desgastado), conflitos importantes com filhos adolescentes maiores e adultos jovens. Paralelo a isto, podem ter quadros somáticos aparecendo, merecendo cuidados médicos e emocionais. A sensação deles pode ser de falência pois perderam alguns parâmetros que tinham assegurado. Mas estão vivos, e com a minha experiência destes anos, ao contrário, estão férteis para um redimensionamento e correção de rota para uma vida melhor.
Os homens de meia idade que questionam o casamento são os que estão também com a possibilidade de perceberem que já não são como eram em sua juventude, quando então escolheram com quem e como seria a construção de suas vidas familiares. Se estão questionando, podem estarem se percebendo sós, por se sentirem incapazes de preencherem uma vida interior não só com patrimônio, postos ou contas bancárias seguras. É muito comum dizerem que não conseguem mais amar (seja do ponto de vista sentimento como do ponto de vista de sexo). Foram apagando essa chama, investindo no “fazer” e não no sentir. Muito poucos tem a consciência de solidão com o desmanchar o casamento. Ao contrário, se estão pensando nisto, já começam a se mexer e procuram um relacionamento extra-conjugal e quando se sentirem mais seguros, já iniciam um outro casamento.
Quando aparecem as dificuldades na fase da meia idade para lidar com o “herói” e “sábio” ou “guru” , que justamente cabem naquela conceituação da fase da idade do lobo e do homem professor ou sábio, o homem está se estabelecendo na maturidade masculina. Ele não precisa provar que se tornou homem. Ele já é. Ele pode querer usufruir de uma sexualidade mais liberal ou de experimentar o poder através de situações como carros, status e propriedades. Ele pode sim, ao se deparar com um certo declínio físico, querer recuperar o que perdeu ou sabe que vai perder.
Mas não mais dentro da concepção de “tornar-se” mas de “manter-se”. É claro, em um sentido mais profundo se depara com “morte”, perdas etc. Ele só se apazigua no término desta fase, quando já está mais resignado, sem questionar mais relações afetivas (casamento, namoro, sexo), transformações das relações dele com os que estão a sua volta, sua vida profissional, enfim não quer mudar mais nada.
Não vejo como uma fase com um ritual de passagem mas como uma transição. Há uma inquietação inicialmente semelhante as dúvidas que surgem na adolescência.