Violência Psicológica

Entrevista concedida a Vya Estelar sobre os bastidores do relacionamento amoroso

Vya Estelar: Na prática, o que seria a violência psicológica ou emocional no relacionamento amoroso?

Luiz Cuschnir: O relacionamento amoroso tem faces ocultas, não visíveis nem decantadas em verso e prosa nas canções, filmes, histórias… Há aspectos que ficam ocultos por trás de traumas, dependências, inabilidades ou baixa autoestima, que propiciam e desenvolvem as ligações afetivas desgastantes, desvalorizadoras, que seqüestram o potencial humano de quem está envolvido nela, em prol de um suposto amor que engrandece, preenche, promete a felicidade. Enfim tudo isso violenta o espaço individual, o desenvolvimento pessoal e a vida emocional fica invadida pelo outro, pela relação com o suposto amor.

Vya Estelar: Por que existe violência (física e psicológica) no relacionamento amoroso?

Luiz Cuschnir: Neste livro “Os Bastidores do Amor” mostro que além da violência física, encontra-se a psicológica, a emocional, que muitas vezes fica oculta, camuflada por detrás de uma relação que se supõe protegida por trás de uma dedicação, sentimentos de proteção, ou até uma extrema dedicação ao outro. A dependência emocional, a necessidade de ser aceito(a) pela outra pessoa, a baixa auto estima ou outros traumas na vida psicológica podem levar a uma relação onde exista um estado ou ocasiões de violência.

Vya Estelar: Existe alguma forma do casal minimizar essas violências e buscar o equilíbrio na relação? Quais dicas práticas ou conselhos o senhor daria?

Luiz Cuschnir: Essas violências originam-se de diversos pontos, desde situações que estão fora do relacionamento, provindas de experiências anteriores da história de cada um, como provém de momento do relacionamento propriamente dito, onde um ou os dois não estão conseguindo encontrar um referência adequada para ao mesmo tempo se respeitarem e conseguirem construir uma linguagem comum e ao mesmo tempo fortalecerem os laços afetivos. Dialogar sem exageros, manifestar o afeto, o carinho sem invasões ou cobranças de retorno do mesmo, uma escuta ampliada com uma percepção clara de que o outro é realmente uma outra pessoa, com vivências e sentimentos distintos e aceitáveis, mesmo que sejam muito diferentes, podem ser bons caminhos para um equilíbrio.

Vya Estelar: Quando o amor pode causar pânico?

Luiz Cuschnir: Pânico tem a ver com medo. Qualquer relação que apresente risco, seja de maus tratos ou abandono, traição etc, principalmente se há indícios anteriores na vida, podem presentificar medo. Se há um desequilíbrio maior, espectativas exageradas, muita insegurança para permanecer no relacionamento podemos nos deparar com um medo excessivo, um pânico genericamente falando.

Vya Estelar: Quando uma paixão vira destruição?

Luiz Cuschnir: Uma paixão por si só já é um estado com certo descontrole. Implica em um envolvimento com uma imensa entrega, muitas expectativas e não raro, idealização do outro. Colocar uma pessoa como o centro da sua vida é complicado por vários motivos. Quando coloco no subtítulo deste último livro que abordo “os sentimentos e as buscas que invadem os nossos relacionamentos e como lidar com eles”, estou ampliando a percepção da paixão. Ela é colocada como o principal do amor, mas que pode criar um mito inatingível, uma necessidade e dependência do outro, gerando expectativas, cobranças impagáveis, muitas vezes inseridas em um contexto do amor. Estamos então diante de um alto risco de destruir o que poderia ser um lindo caminho, amoroso e respeitoso para com um e outro. Ambos acabam se destruindo também.

Vya Estelar: Uma pessoa que está começando um relacionamento, como ela pode detectar sinais ou quais sinais demonstrariam que esta relação poderá ser destrutiva?

Luiz Cuschnir: Então, esse sim é um bom momento para se verificar as possibilidades de se estar construindo um relacionamento amoroso destrutivo. Um dos sinais de que se pode estar nesta situação é se não se conseguiu “zerar” a relação anterior. Na verdade, isso é o mais difícil. Esse “zerar”, terminar internamente com uma relação anterior importante é quase impossível. Todas elas deixam marcas, às vezes até positivas que interferem na seguinte. Quando são negativas, que é mais comum, trazem a frustração do término, ou mesmo o alívio, mas deixam as pegadas de insatisfações, agressões, incompreensões etc. A tentativa na seguinte pode até ser não cair mais no mesmo erro, desacerto, mas é muito comum haver uma sombra da anterior. Isso quando não vira uma “coleção” delas. Outros sinais importantes que demonstram a destruição é se não há suficiente respeito, entendimento de que o outro é OUTRA PESSOA. Esse outro indivíduo tem uma outra história, outra formação, teve outra família, vem de outras experiências.

Vya Estelar: Não sei se tem regras, mas existe alguma forma saudável de se sair de uma relação destrutiva?

Luiz Cuschnir: Numa primeira instância, já perceber que a relação é destrutiva, já dá um bom caminho para cuidar dela. Quando se percebe que o que se ganha, o que preenche, aquilo que pode ser um desenvolvimento pessoal proveniente de um bom relacionamento amoroso já não está ocorrendo, é hora de se repensar se vale a pena manter tudo como está. A forma mais saudável é quando isso ocorre ao estar bem fortalecido, bem consciente do que se quer. A psicoterapia tem sido o melhor instrumento para se atingir esta segurança. Não é uma mágica. é um processo às vezes doloroso, intenso, arrebatador, vencer dependências tão profundas, e devastadoras.

Vya Estelar: Quando acontece uma violência física pela primeira vez ou quando começa a se instalar, ou mesmo quando já está instaurado esse tipo de comportamento na relação, é possível “virar o jogo” ou o respeito mútuo já foi pro saco?

Luiz Cuschnir: Às vezes é um mito, que se há um deslize, já é para finalizar tudo. Muitas vezes serve para um alarme. Outras podem servir para um total redimensionamento da comunicação. O mais importante não é a violência física. Ela fica até mais aparente, constatável. O pior é quando estamos perante uma violência emocional, uma invasão que surge e permanece de forma sub reptícia, e nem se dá conta e fica-se enredado neste vínculo, formando mais e mais amarras, e fica mais difícil de se tomar um novo rumo para a situação, que poderia com certeza ser a separação, o afastamento. Como falei neste livro, corpo de delito físico é fácil se constatar.O mais difícil, é o corpo de delito, a evidência emocional de uma violência.

Vya Estelar: Quando se manifesta a violência na relação seja ela fica ou psicológica, isto significa que um dos cônjuges, mesmo que inconsciente, “permitiu”?

Luiz Cuschnir: Fico sempre com muito receio de interpretações simplistas como essas de que se ocorreu é porque o outro “gostou” ou deixou. As relações tem meandros tão obscuros, as dependências são tão camufladas, a vida em si é tão difícil de se resolver, levar a diante, que se dar conta de que algo está acontecendo, na seqüência dos acontecimentos, do dia-a-dia, é mais do que consciente ou inconsciente. Em um processo terapêutico, leva-se algum tempo para evidenciar isso, quanto mais sem este auxílio.

Vya Estelar: Quando percebo que em conseqüência da violência na relação, seja ela física ou psicológica, que está na hora de pular fora?

Luiz Cuschnir: Está na hora de pular fora é dentro do limite de cada um. Todos temos algum, mas nem sempre este serve para o outro. O cuidado sempre deve ser como cada um vai ficar depois do “pular fora”, para não ser um ato, uma ação sem sentido, sem estrutura, sem estratégia suficiente para a sustentação do procedimento.

Vya Estelar: Já ouvi de muitos terapeutas que inconscientemente quem está uma relação destrutiva, procurou no fundo este tipo de relação. Isto é verdade? Por quê?

Luiz Cuschnir: Há pessoas que se desenvolvem com conflitos que propiciam, ou até buscam relações que as estimulam, que estão nesta esfera destrutiva. Relatos vários casos, todos fictícios, mas baseados na minha experiência profissional de 31 anos como terapeuta, onde pessoas precisam de situações de risco, estão acostumadas, ou até se desenvolveram com esse específico referencial. Precisam de relações onde a intensidade, sentir-se intenso, vivo, quase é sinônimo de violência, ou invasão.

Vya Estelar: Entre os gêneros teria digamos… um determinado tipo de violência inerente a cada, como por exemplo, homens teriam uma tendência a um determinado tipo de violência e a mulher a outro? Por quê?

Luiz Cuschnir: Não é bom se caracterizar tão separadamente homem e mulher. Ambos podem ser invasivos, ambos podem criar seus seqüestradores, para depois acusarem-no disso. Ambos podem sem perceber, criarem os próprios cativeiros. Homens podem usar mais o poder físico, o dinheiro. Mulheres podem utilizar o mesmo, mas podem também utilizar o emocional, o ser vítima, mas os homens também utilizam o “coitado”, o carente para isso.

Ambos podem ser igualmente perigosos, mas ao mesmo tempo, tanto um como o outro precisa muito de uma relação completa, íntegra, que preencha suas necessidades.

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