Revista da Folha por Debora Giannini – dezembro 2006
“Não conseguimos conversar, é só gritaria, diz ex.”
Como os diamantes, ex é para sempre. Mas, no segundo caso, mesmo a eternidade de uma vida pode ser uma maldição. Aquele homem com quem você compartilhou tempo e intimidade agora quer te ver pelas costas -ou nem assim. E a namorada para quem você, apaixonado, baixou a guarda, não hesita em tirar partido das fraquezas reveladas em momentos doces.
“Ele/ela virou outra pessoa” é o mantra padrão. Outro mantra comum nesses casos tem a ver com o “aprendizado” que as separações costumam suscitar nos ex. Foi o que aconteceu com a empresária Marli Aluizio Gaz, 55.
“Resolvi me afundar no trabalho, comecei a valorizar minha vida profissional assumindo o controle das minhas próprias finanças. Isso trouxe emoção à minha vida”, diz.
Diante da avalanche de uma separação, não há guru capaz de prever como cada um vai reagir. As “mutações” são inevitáveis e imprevisíveis, como sabe qualquer profissional que lida com implosões familiares.
“Quase 100% das pessoas não têm idéia de como reagirão a uma separação, a maioria se surpreende, consigo mesma ou com o outro. Às vezes, o casal vai se preparando para o fim, mas, quando acontece, os acordos feitos antes da ruptura não são cumpridos e, emocionalmente, eles não agüentam”, afirma o psiquiatra Luiz Cuschnir, coordenador geral dos Grupos de Gênero do Serviço de Psicoterapia do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas e autor do livro “Os Bastidores do Amor” (ed. Alegro).
Há sempre mais coisas em jogo do que revelam as razões brandidas de lado a lado.
“é um plano de vida que você tem que mudar. Eu me separei em 1987 e até hoje não tenho um relacionamento bom com minha ex-mulher. Não conseguimos conversar, é só gritaria”, conta o publicitário Maurício, 53 (nome fictício).
Um estudo norte-americano realizado pela psicóloga Mavis Hetherington, da Universidade da Virgínia (EUA), observou 1.400 famílias ao longo de 40 anos e revelou que, após a separação, 30% dos indivíduos ficaram “melhores” do que eram, ou seja, conseguiram potencializar qualidades pessoais com a crise, 20% afundaram em depressões, e o restante não anotou quedas ou saltos significativos. Mesmo esses 50%, no entanto, dificilmente passam ilesos pelo período que os psicólogos chamam de “luto”-o inevitável sentimento de perda após a morte de um projeto. No caso, um projeto de vida em comum.
“Ninguém se casa por outro fator que não seja o desejo de ter uma vida feliz e, quando isso não acontece, a frustração é muito grande”, diz Maurício, que chegou a ter impotência sexual e foi parar na terapia.
E se o jogo do relacionamento foi realmente sério, não há possibilidade de só ganhar, como lembra Cushnir.
“Quando a pessoa segue outro rumo, fica a sensação de que ela levou a história do casal, o que significa parte de nossa própria história. Quanto mais grudados um no outro, maior a dilaceração.”
A capacidade de reagir à dor varia, mas a tendência da humanidade é partir para algum tipo de exagero. Comer, trabalhar, beber ou chorar demais, ou ainda, sair transando a torto e a direito.