Elle por Laura Muller
(Ele não liga no dia seguinte, dá milhões de furos e sempre vem com uma desculpa pior que a outra. Mas mexe com a sua libido como ninguém. Será que estamos diante de uma nova regra dos tempos modernos: muita tensão for a da cama, muito tesão em cima dela?)
Ricardo* é um solteiro convicto de 35 anos. Engenheiro e dono de uma empresa de sucesso, tem carros importados e uma agenda de mulheres que ocupa para lá de 100 MB de memória no palmtop. Numa tarde de folga na sexta-feira, vai ao shopping tomar um café e encontra Laís* fazendo compras. Conversa vai, conversa vem, e eles acabam trocando telefones.
Ele combina ligar no dia seguinte. Não liga. Uma semana, duas, e nada. Laís telefona e convida o sumido para jantar num japonês na mesma noite. Ele aceita no ato. Sushi, saquê, mais saquê e… bingo! O clima pega fogo no restaurante, continua no elevador do prédio dele e só termina três horas mais tarde, com Laís exausta e contabilizando mais orgasmos nessa noite do que em todos os últimos meses juntos. Ela volta para casa em estado de graça. Melhor (ou pior): apaixonada. Ele desaparece.
Alguém já viveu uma história desse tipo? Muitas mulheres têm se deparado com o “cafa moderno”. Ele tem sorriso envolvente, corpo sarado e pode até ter carinha de bom rapaz. Lindo, fofo, gostoso. Diante desses atributos, você finge que não conhece a fama. As amigas avisam, mas na sua cabeça elas estão é se roendo de inveja. E você liga de novo para Ricardo. Marca novo encontro depois de um mês. Transa de novo e o coração vai a mil. Uau! Você quer esse homem do seu lado, de preferência 24 horas por dia. Mas ele some novamente, dessa vez por mais tempo. Você insiste. Ele vem, ele vai. É etéreo. Você sabe disso. Ah, mas faz certas coisas tão bem…
Calma, que Freud explica. Esse é o velho e conhecido Dom Juan, em versão embalada numa calça Diesel ou num terninho Armani: é um cara extremamente sedutor, mas incapaz de se vincular a uma mulher só. Para a psicanálise, isso é coisa de uma infância meio atrapalhada, de uma relação mal resolvida com a única mulher na vida merecedora de seu amor. Estamos falando dela: a mamãe. (Que somos ou podemos ser, hein! Lembre-se disso ao criar filhos! As futuras gerações de garotas agradecem.) No fundo, para o cafa moderno, ou o Dom Juan de sempre, mulher boa o suficiente, só mesmo a mãe. Resultado: um solteiro com fobia de relacionamentos duradouros. É péssimo no amor (não quer se comprometer com ninguém), mas excelente na cama (ele precisa ser bom em alguma coisa, não é verdade?).
“Faz um ano e meio que não consigo parar de pensar nesse cara”, conta Laís. “Nesse tempo, Ricardo já ficou com duas amigas minhas, que eu mesma apresentei a ele na academia! Mas parece que, quanto mais ele pisa na bola, mais gostoso fica quando a gente vai para a cama. Será que eu estou louca?”
Ainda não, Laís. Mas é bom abrir o olho. O psiquiatra e psicanalista Luiz Cuschnir, autor de “Homens e Suas Máscaras – A Revolução Silenciosa” (ed. Campus), explica que usamos máscaras diárias, que se confundem com o nosso próprio rosto, escondendo os nossos sentimentos mais camuflados, os nossos desejos mais contidos, as nossas verdades mais subcutâneas – e não estamos falando da aplicação semestral de Botox! Então, quando Laís, ou qualquer outra pessoa, se depara com uma relação do tipo sexo-nota-dez-amornota-zero, deve se perguntar o que quer esconder de si mesma quando cai nessa roubada. E o que será que o cara está escondendo por trás da pose de apaixonado, que sobrevive o tempo suficiente para uma transa só – ótima, sempre é bom lembrar.
“Quem consegue enxergar por trás da máscara sai ganhando”, alerta Cuschnir.
Isso não é tarefa fácil, não! O caso de Verônica* ilustra bem a dificuldade. Aos 28 anos, ela não conseguia chegar ao orgasmo. Havia tentado de tudo um pouco: sessões de terapia, brinquedinhos de sex shop, roupa de oncinha para estimular a imaginação. Mas nada de dar certo. No fundo, ela já estava achando que o tal do orgasmo era invenção do Sidney Sheldon para vender livro. Até conhecer o vizinho, Rodrigo*, 23 anos, surfista, barriga de tanquinho. Não era de falar muito, e nem precisava. Depois de dois ou três meses encontrando o belo por acaso na garagem, no elevador, na portaria do prédio, ele convidou Verônica para um chope. Ela topou. Foram em um bar descolado, com a cara de praia. Um clima gostoso, descontraído. E ele não fez cerimônia: depois de dez minutos de papo, foi para cima dela e tascou um beijaço. Verônica quase não acreditou. E lá veio um novo beijo. Mão pra lá, mão pra cá, e a noite terminou num motel e Verônica finalmente foi apresentada ao tão falado orgasmo!
“Não sei até agora como ele fez. Eu só sei que eu cheguei lá”, conta, esfuziante. Estava decidido ali mesmo: aquele era o homem da vida dela.
Só que Verônica se esqueceu de contar isso ao fofo.
“Muitas mulheres hoje ainda confundem cama com proposta de relacionamento”, alerta a psicóloga e terapeuta sexual Sonia Daud, coordenadora de pós-graduação em sexologia da Faculdade de Medicina de São José do Rio Preto, São Paulo. A gente sabe que algumas garotas são meio apressadinhas: enquanto o cara está curtindo o tesão do momento, elas já imaginam a decoração da igreja e bolam a lista de convidados.
“É preciso deixar as coisas acontecerem aos poucos, no tempo de cada um”, completa Sonia. O que significa cair na real: às vezes, ou em muitas delas, uma transa é só uma transa. E não há nada de mal nisso. Sabe o tal homem-objeto? É uma forma de encarar a situação. Enfim, não é caso para sonhar com a aliança no dedo esquerdo.
Verônica, na empolgação, não conseguiu ler os sinais e ficou caída pelo surfista.
“Virei a faz-tudo dele. Ia no apartamento, dava uma geral, comprava comidinhas gostosas, passeava com o cachorro. Virei a ajudante”, conta. E o sósia do Kelly Slater fazia o quê?
“Chegava e falava: ‘Oi gata, hoje eu tenho um lance com meus amigos, tá legal?’ E eu ia para casa chorar, angustiada, morrendo de raiva.” O bom senso diria para Verônica mandar a conta do supermercado e nunca mais falar com o traste, certo? No entanto, os hormônios têm poderes que a razão desconhece. No dia seguinte, ela ficava esperando uma mensagem do surfista no celular, respondia prontamente e estava a postos para tudo o que ele precisasse. E Verônica confessa:
“Já faz três anos que isso começou. Tive outros caras, mas até hoje não me curei desse. Por quê?”
Agora quem explica é Jung. Difícil ter uma resposta certa, mas dá para arriscar algumas hipóteses: muitas vezes, a gente enxerga no outro só aquilo que quer ver. No caso de Verônica, talvez ela só queira ver o quanto ele é bom de cama e se engana, tentando acreditar que isso é o bastante para um relacionamento. Então, brinca de casinha com ele, enche o menino dourado de mimos e cuidados e não consegue perceber o quanto está sendo maltratada. é difícil enxergar as próprias costas, dizem os psicólogos junguianos. E para onde vão as atitudes deploráveis do pseudonamorado de Verônica? Ela carrega justamente nesse lugar: nas costas.
Precisa ser assim? Não necessariamente. O primeiro passo é reconhecer como a gente lida com a situação. O segundo é sair da inércia e procurar outros tipos de homem.
“Ah, não tem homem bom de cama que não seja meio cafa”, diz Claudia*, a melhor amiga de Verônica, que vibrou quando soube do primeiro orgasmo dela. Será mesmo? Será que estamos eternamente condenadas a preferir o bonitão mau do Sawyer ao bonzinho Jack, da série Lost? Ou será que o nosso radar está mal sintonizado?
Na realidade, falta afinar melhor o radar dentro da gente, afirmam em uníssono Luiz Cuschnir e Sonia Daude. A explicação é simples: conviver com um amante desse tipo mobiliza uma energia danada. Você tem que seduzi-lo, estar sempre linda e loira, ficar de plantão para o que der e vier, mandar bem na cama, cercar esse sujeito difícil de agrados. E o cara vai lá, se supera no sexo, você fica nas nuvens e se esquece de todas as migalhas indigestas que está acostumada a receber dele. E investe de novo uma energia gigante na relação. Essa energia é pura libido. É tesão, desejo. É sexo nota mil.
Já o cara atencioso, carinhoso, que abre a porta do carro para você, paga a conta e a trata bem não requer tanto suor e lágrimas. Você pensa:
“Está tudo dominado!” E vai aos poucos parando de se produzir linda e loira, de ficar de plantão para o que der e vier, de querer mandar bem na cama, de seduzi-lo etc. O que aconteceu? Cadê toda a energia que você mobilizava intensamente com o folgado sexy? Já era. Quando isso acontece, o seu tesão vai acabando e, por mais que o cara se esforce nos lençóis, falta o detalhe fundamental: o seu pique. Não dá para pôr a culpa só no moço, não é? Sem colaboração da parceira, não há atleta sexual que dê jeito!
O segredo para virar o jogo é mais óbvio ainda: é preciso investir mais energia nas relações produtivas, sem fazer pouco dos bons moços. O Sawyer é de tirar qualquer uma do sério, mas pode acreditar: a combinação amor + sexo bom é possível. Agora, se você curte os cafas, fazer o quê? Caia na real, ligue para o seu homem objeto e boa viagem!