Entrevista concedida à Revista Época
Marcelo de Valécio: Comente a pesquisa sobre a mulher no mercado de trabalho. Principais conclusões.
Luiz Cuschnir: As mulheres tem tido repercuções tanto do ponto de vista das afirmações e confirmações, como o fortalecimento do que compõe a identidade feminina. Isto quer dizer não é só do ponto de vista intelectual, e especificamente profissional, mas as repercuções positivas no asseguramento do “Eu”, de quem elas são, mais profundamente um sentido da vida mais amplo.
Por outro lado é claro, isso tudo têm um custo. às vezes até alto, tanto para o físico, como para o emocional. Afeta-as no corpo, atingindo-as provocando disfunções como as que afetam a fertilidade, anorgasmia e outros comprometimentos fisiopatológicos mais comuns aos homens como gastrites, úlceras, enfartes, doenças articulares, disfunções hormonais gerais, dermatológicos, alérgicos, infecciosos etc.
Marcelo de Valécio: Quais são as maiores dificuldades que as mulheres enfrentam para se tornarem empresárias?
Luiz Cuschnir: Como empresárias elas se distingüem tanto das que estão empregadas, funcionárias de alguma instituição, como das que não trabalham fora de casa dedicando-se à família, casa ou até como voluntárias em entidades assistenciais.
Empresárias têm as facilidades de um tempo, horas programadas por elas próprias. Isto delimita o seu horário de trabalho. Mas também pode ser um equívoco, já que ela são as responsáveis pelo andamento, ou não, da empresa. A facilidade de conciliar então, a vida pessoal ou familiar, muitas vezes se contrapõe às responsabilidades de seu negócio.
A questão ainda de “se tornarem”, começarem um negócio próprio resulta de um estímulo de se desenvolverem por si próprias, mas muitas vezes esbarram em um problema econômico, impedindo-as de iniciá-lo. As casadas podem não conseguir o apoio do marido, as solteiras ou descasadas podem não conseguir decolar profissionalmente por não terem os recursos ou até o estímulo de um companheiro que as asseguraria também emocionalmente.
Marcelo de Valécio: Que vantagens a mulher possui quando se lança aos negócios?
Luiz Cuschnir: Basicamente como falei é o horário para se programar pessoalmente. Também a independência do ponto de vista do desenvolvimento do negócio, facilita que a identidade feminina apareça mais com a sua capacidade (habilidade) e realização profissional. Ela se sente capaz, inteligente, preparada. Por um outro lado, há o tema que desenvolvo no meu último livro “Os Bastidores do Amor” – Sentimentos e buscas que invadem os nossos relacionamentos (Ed. Alegro). Trata-se do seqüestro emocional, quando as pessoas são invadidas emocionalmente por relacionamentos, situações, atitudes que podem torná-las verdadeiramente reféns. Isso pode ocorrer em sua vida profissional, trazendo nos casos de dificuldades de se separarem do trabalho, tarefas, tornam-se verdadeiras escravas delas.
Marcelo de Valécio: Como o sr. avalia a mulher brasileira como empreendedora? Quais são suas principais características (emocionais e racionais) e diferenciais em relação ao homem?
Luiz Cuschnir: Ela muitas vezes passa por situações emocionais que comprometem o seu desempenho profissional. Da mesma forma que podem comprometer em um momento, ao resolverem os conflitos, voltam ao padrão anterior recicladas, mais resolvidas, com uma profunda responsabilidade. às vezes até com culpa de terem sido afetadas. Atingem diretamente sua identidade, e por conseguinte, o que também estão realizando profissionalmente. Têm uma integridade, em sua maioria, que levam para o ambiente profissional uma ética que transforma as relações de trabalho. A flexibilização da mulher, sendo brasileira, inclui a sua afetividade, mais aberta, sincera e disponível para a adaptação às novidades e mudanças.
Homens por sua vez, tendem a se resguardarem, e se organizarem, mais como se fossem gavetas, caixinhas, aonde vão separando seus assuntos, conflitos. Podem se manter invulneráveis aos conflitos emocionais, e ainda muito produtivos profissionalmente. Claro que isso traz um custo elevado, desgastes emocionais, psíquicos e físicos.
Marcelo de Valécio: Quais são as principais áreas de atividades que as mulheres mais se identificam? Por quê?
Luiz Cuschnir: Passou a época onde elas só procuravam atividades tidas como educacionais e auxiliares de homens. Hoje, mesmo com as pesquisas de que há menos mulheres nas áreas matemáticas do que homens, elas se saem muito bem quando se dirigem a elas. As áreas humanísticas e de atendimento seja empresarial, seja como autônomas são as mais procuradas. Tentam incluir seu potencial afetivo mais liberado, desenvolvido muito, e precocemente, para atingirem o sucesso que tanto desejam. Digo que desejam sucesso, como escrevi no meu livro “A Relação Mulher & Homem” – uma história dos seus encontros e diferenças (Ed. Elsevier), porque em nossas pesquisas nos grupos de gênero feminino, aparecem até mais a necessidade de sucesso, como meta profissional que nos homens que pesquisamos.
Marcelo de Valécio: O fato de as mulheres serem mais comunicativas, terem uma grande rede de amizades, facilita para elas abrirem o próprio negócio?
Luiz Cuschnir: Podem facilitar a disseminação de informações, prepararem-se mais trocando as experiências anteriores ou similares, auxiliarem na formação de sociedades entre amigas ou conhecidas, claro que quando aliadas a essa facilidade delas manterem o social, as amizades, com muito mais facilidade que os homens a partir de uma certa idade. Daí é um passo maior, e menos solitário abrir um negócio.
Marcelo de Valécio: Como tem sido a evolução das mulheres no mercado de trabalho, principalmente das que se lançaram aos negócios próprios?
Luiz Cuschnir: O que percebo nestes 31 anos de clínica, atendendo esse perfil de mulheres, a grande maioria está muito satisfeita com sua evolução. Podem se atrapalhar, procurarem conciliar assuntos profundamente ligados ao seu emocional, terem que fazer mudanças de rumo ou de atividade, mas sempre procurando novos caminhos e aperfeiçoamento de seu papel profissional. Em geral, com muito menor queixa de atitudes preconceituosas relacionadas ao machismo do que suas colegas empregadas, funcionárias em empresas.
Marcelo de Valécio: O sr. pode fazer um paralelo da profissional brasileira, principalmente a empreendedora, com as mulheres de outros países? Quais as diferenças mais marcantes da mulher brasileira?
Luiz Cuschnir: Com as características das brasileiras agregando o afetivo e o estético, temos sempre o tempero da estética, vaidade e cuidados pessoais presente fortemente nos ambientes que elas criam. Agregam mais facilmente a cultura da empresa esta necessidade. Não que esta mesma mulher não está presente nas empresas com a direção masculina. Mas é como se fosse mostrado um modelo mais claro, às vezes mais ético nesse sentido. Ao mesmo tempo guardam sempre os aspectos femininos, também confirmam a maior possibilidade de integrarem o profissionalismo com a feminilidade.
Marcelo de Valécio: A mulher ainda sofre muito preconceito para se firmar como empresária? Quais são os principais?
Luiz Cuschnir: Não dá para se dizer que há esse preconceito específico que as coloca tão vulneráveis, ou mais vulneráveis que as não empresárias. Especificamente para esse segmento pode existir em alguns meios a descrença na sua capacidade organizativa, da liderança de um específico campo (transportes, fábricas específicas, empresas de áreas comumente dirigidas por homens). Também especificamente no lidar com a hierarquia de homens, estes já estão definidos como profissionais que aceitam a mesma se trabalharem com elas.
Marcelo de Valécio: Os maridos ou companheiros, a família, os amigos, geralmente dão apoio à mulher que quer o próprio negócio?
Luiz Cuschnir: Os maridos, principalmente os de mais faixa mais elevada (após os 30), tendem a estimular essa atividade, desde que seja viável economicamente. Os mais jovens, e assim como os que podem estar mais vinculados ao conceito ou preocupação que o afastamento da mulher do lar, consquëntemente da educação direta dos filhos, podem ser os mais ressentidos com a mulher empresária. Esta também presente os aspectos econômicos: se ela vai contribuir ou não no orçamento doméstico, o que pode contar muito para o padrão de vida, alem do conforto da família. Há aspectos relacionados à inferioridade masculina deflagrada se esta mulher tem sucesso, principalmente se for maior que o dele. Neste caso pode sem dúvida provocar as declarações que percebemos, principalmente em mulheres mais velhas que trabalhavam antes do casamento, e na nossa pesquisa nos relatam que deixaram “por que ele não queria”. Também esse modelo de mulher mais “liberada” na profissão, pode receber comentários (ou ser alvo sem recebê-los diretamente) de mães ou sogras, quando não de mães de outros que são colegas de escola de seus filhos, de que elas não acompanham o que está acontecendo na educação infantil de seu filho. Há até brincadeiras comentado que elas fazem parte de uma “comissão investigadora e repressora” das mães que não trabalham fora.