Culinária e o Novo Homem

Entrevista concedida a Fernando Lara

Fernando Lara: Existe um “novo homem”? O que o Sr. quer dizer quando apresenta o termo “masculismo”?

Luiz Cuschnir: Sim ,existe um novo homem. Após a revolução feminista, que trouxe muitas mudanças em relação ao papel da mulher, o do homem teve que se adaptar e se transformar para dar conta das novas exigências que estavam surgindo. Surge um novo homem preocupado e participante na educação dos filhos, vaidoso, que cuida de sua saúde, que expõe mais os seus sentimentos, e que está aberto para se relacionar com mulheres mais ativas e exigentes, inclusive sexualmente. Pelo menos este é o modelo que os homens estão tentando alcançar. Assim como para as mulheres, estas mudanças são muito novas, e exigem um certo tempo de adaptação. O masculismo não é um movimento contrário ao feminismo, ou as mulheres modernas, e sim uma tentativa de se chegar a um homem mais completo e preparado para estas mudanças.

Fernando Lara: A culinária está no cardápio do homem?

Luiz Cuschnir: Sempre esteve. Os chefes de cozinha mais reconhecidos e bem pagos do mundo são homens. Porém não era tao frequente ver homens cozinhando em suas próprias casas e com tanto prazer. A culinária está ganhando cada vez mais adeptos do sexo masculino.

Fernando Lara: O que ele busca ao cozinhar?

Luiz Cuschnir: Cozinhar pode ter alguns significados especiais para os homens. Este novo homem que está surgindo, além do provedor financeiro, descobriu também que pode prover mais afeto e carinho para seus familiares, o que consegue passar através de uma refeição gostosa e feita com dedicação. Há também uma expressão da independência masculina em relação a mulher, não precisa mais dela para se cuidar, consegue fazê-lo sozinho.

Fernando Lara: Qual é o novo contexto que explica o interesse do homem por culinária?

Luiz Cuschnir: Antigamente os papéis eram muito rígidos e bem definidos. Homem faz isto, mulher faz aquilo. No entanto, hoje em dia há espaço para esta mistura. Homens podem fazer coisas que antes eram consideradas do universo feminino e vice-versa. Não há tantos preconceitos em relação a isto. A culinária é também um exercício de criatividade, sensibilidade e cuidado com o outro e consigo mesmo, coisas que o homem está começando a desenvolver a sua maneira, ou seja, de uma maneira masculina. Homem nesta situação, quer ser valorizado, com sua auto-estima confirmada como homem.

Fernando Lara: é possível afirmar que a mulher soube explorar e entender o mundo masculino e que isso causou um movimento espelho – o homem fazendo uma incursão pelo universo feminino?

Luiz Cuschnir: Ao meu ver as mulheres não conseguiram entender e explorar muito bem o universo masculino, e talvez não seja este o propósito. As mulheres fizeram a revolução feminista pedindo igualdade, mas muitas vezes erraram ao tentarem imitar o que os homens faziam. Isto causou uma confusão de papeis tão grande e que trouxe tanta cofusão, que as antigas feministas estão revendo e re-dividindo o que cabe ao homem e a mulher, não querem mais serem iguais, mas sim respeitados em suas diferenças. Isto trouxe mais liberdade para ambos os sexos se expressarem em diferentes ramos. O fato de homens entrarem no ramo da culinária, não significa que eles vão cozinhar exatamente como elas. O interessante disto tudo é descobrir formas masculinas para fazer coisas femininas e vice-versa.

Fernando Lara: Até que ponto essa “incursão” é voluntária e à partir de que ponto ela passa a ser “questão de sobrevivência”?

Luiz Cuschnir: Esta “incursão” é voluntária quando há prazer e vocação envolvidos, sem nenhuma necessidade além dessas. Passa a ser uma questão de sobrevivência quando para não passar fome, ou se cuidar melhor, o homem que mora sozinho ou com amigos (alguns até com a família e têm uma esposa que não quer cozinhar) é obrigado a aprender cozinhar. Mesmo assim, de um jeito ou de outro, não há nada de exclusivamente feminino na culinária, e um bom exemplo disto é o churrasco, culinária tipicamente masculina.

Fernando Lara: Diz-se que o “novo homem” é um homem que tirou a roupa de super-herói e expôs suas fraquezas. Porém, ao mesmo tempo, ele começa a ser cobrado por outros “pré-requisitos” – sensibilidade, vaidade, bom gosto – que antes o comprometeriam como homem. O que o Sr. acha disso?

Luiz Cuschnir: O homem expôs as suas fraquezas e percebeu que as mulheres não querem isto. Nenhuma mulher quer um homem fraco, que não ag&uulm;ente as responsabilidades do dia a dia. Sensibilidade não é sinal de fraqueza, coisa que ainda é muita confundida pelos homens. Do mesmo jeito que as mulheres são cobradas em muitos requisitos como: boa mãe, amante, magra, bem sucedida no trabalho e etc… Os homens estão sendo cobrados em sua sensibilidade, vaidade e refinamento, porém não se deve utilizar os referenciais femininos para estas qualidades, e sim procurar formas esscencialmente masculinas para expressar tais quesitos. Só assim o homem vai poder ser sensível, vaidoso e ter bom gosto sem se comprometer com sua masculinidade.

Fernando Lara: A sociedade perdeu seus preconceitos quanto ao homem que cozinha ou esse é um movimento restrito às classes mais altas?

Luiz Cuschnir: Eu diria até o contrário. Nas classes mais baixas, onde há tanto desemprego, fome e miséria, não há tantos espaços para preconceitos deste tipo. Acho que não é uma questão de preconceito entre classes sociais, mas em relação a gerações. Pessoas mais velhas, que tiveram a educação mais rígida por parte dos pais, com os papéis de homem e de mulher bem definidos, tem maiores dificuldades em aceitar este tipo de atitude de um homem. Já pessoas desta nova geração pós-feminismo, tem outra cabeça, aceita estas misturas sem muitos preconceitos.

Fernando Lara: Um professor de culinária entrevistado acredita que, ao cozinhar, o homem inconscientemente busca uma capacidade, até então, exclusiva das mulheres: amamentar, alimentar, prover comida (e por que não vida?) a outras pessoas. O que o Sr. acha disso?

Luiz Cuschnir: Acho que não é tão inconsciente assim. Já tem espaço na consciência masculina para tais atos, ou experiências que antigamente eram consideradas tipicamente femininas em nossa cultura. O homem está descobrindo prazer em alimentar sua família, em prover vida como você disse. Não há nada de errado com isso, é uma ampliação das capacidades masculinas de prover amor e se auto cuidar.

Fernando Lara: Através das primeiras entrevistas, tem sido possível perceber que o homem só cozinha em ocasiões especiais, por hobby, prepara pratos sofisticados e não gosta de lavar os pratos. Além disso, não “limita” o sabor de seus pratos tentando buscar uma alimentação mais saudável – usa quantidades maiores de ingredientes “perigosos” do que as mulheres. é possível afirmar, à partir dessas constatações, que a relação do homem com a culinária é pautada pela busca do prazer?

Luiz Cuschnir: A relação do ser humano com a vida é uma eterna busca do prazer. Como já citei em respostas anteriores, o homem na culinária não está buscando imitar a mulher, mas sim se expressar e ampliar seus campos de atuação. Por isso, não espere que os homens sigam os padrões culinários femininos, eles irão fazer as receitas ao seu próprio modo. Comidas com temperos e níveis de gordura que lhes sejam agradáveis. No entanto o “novo homem” também se preocupa com a sua saúde e aparência física, o que lhe dá condições de balancear de uma forma adequada os diversos elementos da culinária.

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