Casar ou morar juntos?

Entrevista concedida à Mariana Teodoro – site Abílio Diniz – 09/06/2011

Mariana Teodoro: Dr. Luiz, em tempos onde é comum encontrarmos relacionamentos instáveis e sexo sem compromisso, qual a importância do afeto e da cumplicidade de um namoro estável?

Luiz Cuschnir: A manutenção de um relacionamento em longo prazo e a possibilidade de dedicação a uma só pessoa cria um vínculo afetivo mais profundo. A dependência criada entre os dois dá a sensação de companhia e um seguimento de uma vida em comum que indica um específico plano de vida juntos ou complementares. É uma vivência que integra a vida de dois em um sentido comum com um projeto de vida.

Mariana Teodoro: E quais benefícios o namoro pode trazer pra saúde e para qualidade de vida?

Luiz Cuschnir: Há uma proteção e um cuidado com o outro que propicia uma maior segurança. É o mesmo que em termos gerais se obtém de um contorno familiar. Ter alguém que sabe onde o outro está, que pergunta como está caminhando a sua vida e dá apoio constante pode ajudar a apaziguar as angústias e exigências que a vida impõe. Há estudos onde se encontra uma menor incidência de doenças físicas ou psíquicas, inclusive o suicídio, em pessoas que têm relações estáveis, o que não acontece em pessoas que são sozinhas ou solteiras.

Mariana Teodoro: Nesse sentido, podemos dizer que namorar ajuda inclusive a reduzir o estresse e as irritações do dia-a-dia?

Luiz Cuschnir: Primeiro temos que precisar que há também namoros perniciosos e patológicos que podem levar pessoas a alto nível de stress e quadros psíquicos sérios. Denominei em um dos meus livros anteriores de “seqüestro emocional”, quando os dois estão envolvidos numa relação de dependência doentia. Mas falando de relacionamentos constantes que criam uma rotina e mantém uma atenção e dedicação amorosa, namoros saudáveis, dão a chance de cada um apoiar e ser apoiado com uma dedicação que alivia muito e ajuda a passar os dias de uma maneira mais leve.

Mariana Teodoro: Hoje, muitas pessoas priorizam estudos, carreira e trabalho e deixam a dedicação ao namoro de lado. Como isso pode atrapalhar a relação?

Luiz Cuschnir: Se a prioridade sempre está fora do namoro, ele se enfraquece e provoca o distanciamento dos dois. Essa situação impede que os dois saibam mais do que o outro está vivendo, tenham dados atualizados dos planos e relacionamentos que estão ocorrendo, enfim saibam o que está acontecendo com o outro. Assim há mais chances de seguirem vidas tão isoladas que o relacionamento pode perder o sentido de manterem-se ligados afetivamente.

Mariana Teodoro: O que não pode faltar em um namoro para ser bom e completo? E que atitudes podem ajudar os casais a melhorar a relação?

Luiz Cuschnir: Não pode faltar de jeito nenhum o respeito ao outro, a clareza de que é uma outra pessoa que teve e tem uma história de vida diferente dela. Depois que o outro não é posse, não foi adquirido para satisfazer o que ele ou ela tem de ideal de namorado ou namorada. Que a admiração e a comunicação dela para o outro precisa acontecer regularmente – todos precisam ser valorizados, ter a auto estima mantida e sentirem-se importantes para o seu par. E é imprescindível levar o relacionamento com bom humor, tentando sempre trazer o prazer de estarem juntos com carinho e cuidado para com o outro. Não preciso dizer que cuidar é diametralmente oposto a agredir, falar palavrões e menosprezar o outro.

Mariana Teodoro: Falta diálogo nas relações de hoje?

Luiz Cuschnir: Não dá para se dizer que existe menos diálogo hoje que nas gerações passadas. O que mais trabalho nos grupos de homens e grupos de mulheres do meu Serviço no Instituto de Psiquiatria do HC da Faculdade de Medicina da USP – o Gender Group®, é a ampliar a capacidade e a possibilidade de homens e mulheres dialogarem. Hoje se fala em discutir a relação, mas nem sempre ela é possível, pois pode trazer grandes estragos pela falta de cuidado no que cada um fala para o outro. O que se fala pode nunca mais ser esquecido e ser somente um desabafo que para o outro pode ser mal entendido.

Mariana Teodoro: Por que sempre ouvimos casais reclamarem que depois do casamento, a relação cai na rotina e pode piorar.  Como manter os mesmos aspectos positivos do namoro dentro do casamento?

Luiz Cuschnir: É quase uma mágica que precisa ser refeita a cada fase ao longo da vida. O que o casal passa nos diversos momentos devem servir para construir uma história em comum. Essa história muitas vezes se completa com a construção da família e cada etapa do relacionamento deve ser vivida com a maior intensidade. Mas é muito importante que a valorização da presença do outro em cada uma dessas vivências seja evidenciada. Isso é muito difícil e as pessoas se esquecem de colocar o outro como co responsável para esses momentos ocorrerem e deixam de lado a cumplicidade e a consideração pelo que o outro contribuiu para o que ocorre ao longo do casamento.

Mariana Teodoro: O Sr. acha que a tecnologia influencia nos namoros atuais? Já vi casais que terminaram namoro ou só conversam por mensagens de celular. Outros que brigam sempre por causa das redes sociais.

Luiz Cuschnir: Sim, a comunicação virtual muitas vezes é truncada e pouco expressiva podendo criar grandes transtornos nos namoros. Não se pode confiar que o outro recebe o que se está oferecendo e via celular é mais perigoso ainda. Já as redes sociais abrem informações que muitas vezes expõem o casal de uma maneira que o outro não tem a chance de proteger-se ou manter a intimidade necessária para um namoro seguir. Isso trás conflitos e pode afetar bastante o vínculo afetivo.

Mariana Teodoro: Muitos casais acabam namorando, mas não estão inteiros na relação. Não se entregam por completo. Isso acaba tendo efeito contrário? Em vez de melhorar, atrapalha o bem-estar?

Luiz Cuschnir: Nem sempre atrapalha, pois pode atender ao que ambos estão querendo naquela determinada fase de vida. Querem realizar outros projetos e o tempo que estão juntos propicia a companhia que ambos estão precisando. Mas se isso não é consenso entre os dois e atingem negativamente um que tem outra necessidade e quer muito mais envolvimento do que o está ocorrendo pode instalar-se um nível de ansiedade que afeta negativamente várias áreas do dia-a-dia.

Mariana Teodoro: E como o Sr. avalia a situação de pessoas que namoram apenas para não ter que ficarem sozinhas, mesmo sem gostar do parceiro (a)?

Luiz Cuschnir: Depende da situação pode ajudar a não deixar que a pessoa se isole e participe socialmente do mundo ao seu redor. Também pode propiciar encontros e vivências interessantes que servirão como experiências de vida. Agora é importante que esse namoro não se constele em uma fuga e estimule a deterioração da auto-estima, além de deixar marcas sociais que impedirão dessa pessoa encontrar uma nova situação amorosa ano futuro.

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